GÓTICO FEMININO E (R)EVOLUÇÃO: A DEGENERAÇÃO COMO PODER EM OBRAS DE CHARLOTTE PERKINS GILMAN, JÚLIA LOPES DE ALMEIDA E MARIANA ENRIQUEZ
Degeneração. Gótico feminino. Conto. Literatura comparada.
A presente tese tem como objetivo analisar como o locus horribilis, a exploração da figura da mulher e a opressão patriarcal, aspectos da perspectiva gótica feminina, colaboram com a degeneração das personagens femininas em três contos escritos por mulheres. As obras são “O papel de parede amarelo” (1892), da escritora estadunidense Charlotte Perkins Gilman, que trata da devastação da mente devido à reclusão compulsória; “A caolha” (1903), da escritora brasileira Júlia Lopes de Almeida, que lida com a marginalização, a pobreza e o estigma social da figura feminina; e “As coisas que perdemos no fogo” (2017), da escritora argentina Mariana Enríquez, que evidencia a resistência extrema diante da violência contra corpos femininos. Os três contos fazem uso de aspectos recorrentes no gótico feminino, entre eles o locus horribilis, para explorar a opressão patriarcal e o medo. O estudo, assim, envolveu análises acerca de como os recursos e elementos literários constroem, em épocas e locais distintos, os aspectos góticos em cada obra. Durante os séculos XVIII e XIX, o gótico literário é marcado por temas como monstros, demônios e sobrenaturalidade. A partir do final do século XIX, as obras deste estilo literário começam a se dedicar também a temas como a subjetividade humana, as questões sociais, a exploração atráves do capitalismo e os grupos minoritários. Esta tese se propôs a estudar o encontro do gótico com a escrita feminina, que resulta em um novo estilo, descrito por Ellen Moers (1976), como gótico feminino. Para as discussões e análises das obras enquanto representações de figuras femininas situadas em contextos patriarcais, buscou-se o embasamento em teóricas que convergem na ideia de que as experiências e identidades femininas são moldadas por estruturas sociais, econômicas e culturais de poder, em especial Badinter (1980), Federici (2017), Saffioti (2006), Perrot (2007) e Priore (2000). No que diz respeito ao gótico, as discussões e análises foram embasadas, entre outros, em estudos sobre o gótico feminino que compreendem o texto literário, em suas várias vozes, enquanto um material de vasto potencial transgressivo da autonomia feminina, a partir de autoras como Heiland (2004), Hoeveler (1998). Tratando-se de ansiedades culturais que permeiam as representações das questões de gênero nos séculos XIX, XX e XXI, manifestadas e representadas nos três contos em estudo, essa tese procurou construir novos sentidos e significados para questões antigas, como a violência cometida a figuras femininas, a exploração de seus corpos, o controle de suas mentes e o silenciamento de suas vozes.