“É COMO VOTO”: RESPONSABILIDADE ENUNCIATIVA NO ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE O CONCEITO JURÍDICO DE FAMÍLIA
Análise textual dos discursos; Responsabilidade enunciativa; Pontos de vista; Discurso jurídico; Conceito jurídico de família.
Esta tese investiga o discurso jurídico do Supremo Tribunal Federal (STF) proferido no acórdão da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 132/RJ, que definiu o novo conceito jurídico de família no Brasil. O estudo foi realizado sob a perspectiva da Análise Textual do Discurso (ATD), com foco na dimensão enunciativa do texto, especificamente no nível 7, referente à responsabilidade enunciativa (RE), conforme proposta por Adam (2011). O objetivo geral do trabalho consiste em investigar a responsabilidade enunciativa no acórdão do STF que definiu o novo conceito jurídico de família no Brasil, a partir da aplicação do Princípio da Interpretação Conforme à Constituição ao art. 1.723 do Código Civil de 2022 (CC-02). Como objetivos específicos, busca-se: i) identificar e classificar o(s) tipo(s) de ponto(s) de vista do locutor/enunciador primeiro (L1/E1), presentes no discurso que definiu a interpretação imperativa; ii) descrever as marcas linguísticas sinalizadoras da (não) assunção da responsabilidade enunciativa e o modo como o julgador hierarquiza os pontos de vista (PDV); e iii) analisar o comprometimento enunciativo do julgador na construção da interpretação constitucional dominante. O corpus é constituído por um acórdão do STF, que foi escolhido pela relevância social e jurídica de sua temática. Para delimitar a análise em questão, foi necessário realizar um recorte textual, cuja escolha recaiu sobre o voto do Ministro Relator, por considerar que a referida ação judicial foi julgada procedente, por unanimidade, em benefício da parte autora; que o voto do Ministro Relator prevaleceu e foi seguido pelos demais ministros da Suprema Corte; que essa parte do acordão contempla a análise feita sobre as questões de fato e de direito expostas no relatório, a partir do qual se constroem as bases lógicas para a decisão. É no voto onde constam as razões e os argumentos que determinam o convencimento do julgador sobre o assunto em questão. A abordagem metodológica da pesquisa é de natureza qualitativa, de base interpretativa, do tipo documental, com utilização do método de abordagem misto, dedutivo e indutivo. Teoricamente, a pesquisa ancora-se nos postulados da ATD, com base em Adam (2010, 2011, 2017, 2019 e 2022) em diálogo com a abordagem enunciativa-interacional do ponto de vista (PDV), segundo Rabatel (2009, 2013, 2016a, 2026b e 2023). No que concerne aos aspectos jurídicos da tese, a abordagem teórica seguiu os autores Albi (2007), Bittar (2010), Cabral (2016), Colares (2010), Cornu (2005), Lourenço e Rodrigues (2013), Petri (1994), Prieto (2013), Rodrigues (2016), Rodrigues, Passeggi e Silva Neto (2014), Streck (1999 e 2017) e Tullio (2012), dentre outros. A análise dos dados revela a possibilidade de múltipla classificação de um mesmo PDV, a depender do aspecto focalizado. Além disso, evidencia que o locutor/enunciador primeiro (L1/E1), ao final de seu voto, assume a RE sobre todo o dizer de seu julgamento. Esse posicionamento discursivo foi classificado como PDV encapsulador, pois com a utilização das marcas linguísticas “eu” (índice de pessoa implícito) e “voto” (tempo verbal com destaque para o presente), L1/E1 formaliza uma conclusão englobante de todas as perspectivas presentes na construção discursiva de seu voto.