QUE CURRÍCULO APRESENTAMOS? Argumentação e diálogos acerca do Componente Curricular de Língua Portuguesa nos documentos oficiais para o Ensino Médio dos Estados Ceará e Piauí
Componente Curricular. Língua Portuguesa. Discurso.
A organização curricular sempre foi uma preocupação dos entes federativos no Brasil. O texto da Constituição Federal (1988) valida esse cuidado ao orientar que os sistemas devem organizar o seus ensinos em regime de colaboração. Assim, cada unidade da federação pode criar um documento curricular, alinhado à proposta da União, que oriente a educação de sua região. O Piauí e o Ceará são exemplos de estados que possuem tais documentos. Diante disso, este trabalho tem como objetivo analisar o discurso dos documentos curriculares estaduais de Ensino Médio do Ceará e do Piauí sobre o componente curricular de língua portuguesa. Nesse contexto, examinamos a tese de ensino apresentada nos documentos, os argumentos que a sustentam e os acordos argumentativos estabelecidos na relação do orador com o auditório. Além disso, investigamos a relação dialógica presente nos discursos dos documentos curriculares do Piauí e do Ceará. Para fundamentar a pesquisa, ultilizamos os pressupostos teóricos da Nova Retórica, de Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005), considerando também as contribuições de outros estudiosos, como: Barthes (1970), Breton (1999), Compagnon (1983), Descartes (1970), Fiorin (2015), Perelman (1992) e Reboul (2004), quanto à análise dialógica, recorremos aos estudos de Bakhtin (1970/1990). Além disso, para o entendimento do objeto de pesquisa, traçamos o percurso do ensino de Língua Portuguesa no Brasil, com base em Freire (2007) e Koch (1990). Metodologicamente, esta pesquisa se caracteriza pela abordagem qualitativa, com objetivo descritivo-interpretativista e utilizações de fontes documentais com base em, Gil (1999), Karl Popper (1934) , Marconi e Lakatos (2003), Minayo (2010), Severino (2012) e Teixeira (2008). A partir das análises, percebemos que a tese do componente de língua portuguesa, nos discursos dos documentos, está direcionada para o desenvolvimento do aluno como sujeito social. O documento do Piauí apresenta a seguinte tese, “esse componente deve possibilitar aos estudantes (principalmente aos jovens) experiências significativas com práticas de linguagens em diferentes mídias, cabendo à escola ampliar situações de aprendizado.” Atrelada a essa tese, o documento apresenta alguns fatores importantes no ensino do componente, baseados em argumentos que a sustentam, como os campos de atuação social, que centralizam o discurso na argumentação baseada na estrutura do real, com o sentido meio-fim. Nesse sentido, o meio refere-se à forma os campos de atuação serão trabalhados em sala de aula, e o fim corresponde à efetivação da tese. Em consonância, o documento destaca o trabalho com os gêneros textuais, a variação linguística e o letramento literário. Os valores centrais são: a pessoa (aluno), o texto (em perspectiva social e interacional), as variedades linguísticas que compõem a sociedade e o texto literário como expressão de sentidos. O documento do Ceará também direciona sua tese ao desenvolvimento do aluno, afirmando : “esperamos que as/os alunas/os tenham condições de participar, de modo mais significativo e engajado, das mais diversas e variadas práticas sociais que envolvem a linguagem”. Para sustentar essa tese, o documento apresenta argumentos baseados na estrutura do real que são determinantes no ensino de língua portuguesa, sobretudo nas concepções de língua e linguagem, compreendidas a partir das práticas de linguagem. Nessa perspectiva, são valorizados o aspecto social, a língua como interação, a diversidade linguística e o letramento literário, esse último como fator determinante na compreensão do texto literário. Além de serem compreendidos como valores, esses aspectos são considerados pelo documento como meios para que a tese do componente no documento do Ceará seja alcançada. Ademais, verificamos que os documentos estabelecem uma relação dialógica com as concepções linguísticas como a sociolinguística, a concepção dialógica da linguagem e análise discursiva. Essa relação também se dá com outros documentos estaduais e, principalmente, com documentos educacionais federais, como a BNCC e os PCNs, em uma perspectiva de concordância e complementariedade. Assim, notamos que o aspecto central no ensino de língua portuguesa é o aluno e que esses documentos, além de nortearem a prática pedagógica, reforçam a identidade do componente curricular.