DA BNCC DO ENSINO MÉDIO À SALA DE AULA: refrações entre a prescrição das competências e a prática no ensino de História
Ensino de História. BNCC. Competências. Refração. Prática docente.
Essa dissertação investiga os processos de refração no ensino de História a partir da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), com ênfase na centralidade da categoria de competência como princípio estruturante da nova política curricular. Partimos da compreensão que a BNCC compõe uma narrativa sistêmica que orienta o desenvolvimento de competências, cuja lógica se mostra frequentemente diferente das concepções e práticas que orientam o ensino de História, gerando tensões e desafios para a prática docente. Utilizamos uma análise qualitativa de caráter etnográfico, articulando análise documental da BNCC, observações de práticas pedagógicas e entrevistas com professores e professoras de História. Nosso referencial teórico se baseia, principalmente, nos conceitos de estratégia e tática, de Michel de Certeau, e de refração, de Ivor F. Goodson, entendendo, assim, a prática do ensino de História como uma prática criadora. Acompanhamos dois professores e uma professora da rede estadual do Ceará, na cidade de Aracati. A partir da análise das aulas acompanhadas, foram identificadas quatro categorias de refração: foco no ensino, conceitualismo, desvio avaliativo e conteudismo. Elas expressam como os docentes interpretam, ressignificam e, por vezes, silenciam as prescrições curriculares no cotidiano escolar. As entrevistas evidenciaram quatro fatores centrais que contribuem para essas refrações: (1) a não participação dos docentes no processo de formulação da BNCC, uma vez que o documento foi elaborado majoritariamente por agentes externos ao ambiente escolar; (2) o conflito de identidades docentes gerado a partir de novos pressupostos para o ensino de História; (3) a polissemia e fragmentação do conceito de competência, o que permite apropriações diversas; e (4) a escassez de processos formativos consistentes sobre as novas prescrições, o que caracteriza um vácuo estrutural em relação às propostas. Além desses fatores, os discursos dos professores revelaram respostas à narrativa sistêmica que se expressam em práticas de adaptação, ressignificação e, em alguns casos, rejeição parcial dos elementos normativos do documento, reafirmando a centralidade do conhecimento histórico e da autonomia docente. A pesquisa contribui para o debate sobre os impactos da BNCC no ensino de História, evidenciando os limites, as tensões e, também, as possibilidades de atuação dos docentes frente às reformas educacionais contemporâneas.