Mátria livre: discurso, memória e resistência feminina na arte pictórica de Marcela Cantuária
Discurso. Resistência. Memória. Arte. Marcela Cantuária. Feminino.
No pensamento de Michel Foucault, poder, saber e ética estão profundamente interligados. Por intermédio de suas considerações sobre o poder, entendemos que essa instância não é apenas repressiva, mas produtiva, moldando comportamentos e subjetividades. Por sua vez, o saber organiza o que pode ser dito como verdade, sustentando o exercício do poder. Já a ética, especialmente em sua fase tardia, refere-se às práticas de si e a elaboração de uma estética da existência, formas pelas quais os sujeitos se constituem e resistem aos modos normativos impostos. Dessa maneira, objetivamos com este estudo compreender a emergência de enunciados materializados em pinturas que figuram no conjunto “Mátria Livre” da artista Marcela Cantuária, pensando sobre a proposição de um canal de resistência aos discursos autoritários retomados no presente por grupos direitistas emergentes e, ao mesmo tempo, de visibilidade para as práticas de si e estéticas da existência elaboradas pelos sujeitos – Mulheres - numa disputa pela memória cultural da Ditadura Militar. O percurso metodológico que seguiremos para analisar os enunciados será fundamentada no aporte teórico desenvolvido por Michel Foucault, que se associa com a interação entre a dimensão arqueológica e genealógica. Entendemos essa lógica como uma abordagem analítica voltada para a investigação das condições históricas que possibilitam a emergência dos discursos em diferentes épocas. Este método não busca reconstruir a história linear de um saber, mas, sim, identificar as descontinuidades, rupturas e regularidades que o atravessa. Nos enunciados analisados, foi possível perceber que a artista mobilizou simbolismos, mitos, acontecimentos e lutas para constituir visualidades que se apresentam como contrapontos aos discursos autoritários, históricos e sexistas, que relegaram as mulheres ao apagamento, a invisibilidade, a inação e a violência. Os enunciados também retomam as práticas de si que esses sujeitos elaboraram em vida, que se concretizam em ações voltadas para a participação em Guerrilhas; a sobreposição de mecanismos de controle autoritário como a censura; a presença em espaços de intelectualidade; a educação crítica do indivíduo; a apropriação de terras, dentre outras. Enfim, esses sujeitos buscaram lutar pela (s) vida (s) num contexto de política de morte e extermínio.